Pode imaginar o que são mitos endopsíquicos? São o fruto mais recente de meus trabalhos mentais.
Na
realidade, seu interesse pela antropologia social vinha de muito tempo antes.
Na
correspondência com Fliess,
além de alusões gerais ao gosto sempre presente pelo estudo da arqueologia e da
pré-história, há um certo número de referências específicas a temas
antropológicos e à luz que a psicanálise lança sobre eles.
No
Rascunho N (31 de maio de 1897), por exemplo, ao estudar o horror ao incesto,
ele assinala a relação entre o desenvolvimento da civilização e a repressão dos
instintos, assunto ao qual retornou no artigo sobre Civilized Sexual Ethics e, muito mais tarde, em Civilization and its Discontents.
Novamente,
na Carta 78 (12 de dezembro de 1897), escreve:
Pode imaginar o que são mitos
endopsíquicos? São o
fruto mais recente de meus trabalhos mentais. A obscura percepção interior de
nosso próprio mecanismo psíquico estimula ilusões de pensamento, que são naturalmente
projetadas para o exterior e, de modo característico, para o futuro e o
além-mundo. Imortalidade, castigo, vida após a morte, todos constituem reflexos
de nossa própria psique mais profunda (…) psicomitologia.
E,
na Carta 144 (4 de julho 1901):
Já leu que os ingleses escavaram um velho
palácio em Creta (Cnossos), o qual declaram ser o autêntico labirinto de Minos?
Zeus parece ter sido originalmente um touro. Parece, também, que o nosso
próprio velho Deus, antes de passar pela sublimação incentivada pelos persas,
era também adorado como um touro. Isso suscita toda sorte de pensamentos, que
ainda não estão em tempo de serem colocados no papel.
Finalmente,
vale a pena mencionar uma breve passagem numa nota na primeira edição de A Interpretação de Sonhos, que
deixa entrever a direção da monarquia
da posição social do pai de família.
Mas os principais elementos da contribuição
de Freud à antropologia social aparecem, pela primeira vez, nesta obra e mais
especialmente no quarto ensaio (o
retorno do totemismo na infância), que contém a hipótese da horda primeva e da morte do pai primevo, e elabora
sua teoria fazendo remontar a isso a origem da quase totalidade das
instituições sociais e culturais posteriores.
O
próprio Freud estimava muito este último ensaio, tanto no que diz respeito ao
conteúdo como à forma.
Contou
a seu tradutor de então, provavelmente em 1921, que o considerava como sua obra
mais bem escrita.
Não
obstante, o Dr. Ernest Jones informa-nos que mesmo em meados de junho de 1913,
quando as provas do ensaio já se achavam prontas e após havê-lo apresentado à
Sociedade Psicanalítica de Viena, Freud ainda expressava dúvidas e hesitações
sobre sua publicação.
Essas
dúvidas foram prontamente afastadas, contudo, e o livro permaneceu sendo um de
seus favoritos durante toda a vida, recorrendo constantemente ao mesmo.
Assim,
por exemplo, resumiu-o e discutiu-o com particular carinho no sexto capítulo de
seu Autobiographical Study e citou-o muitas
vezes no último livro que publicou Moses
and Monotheism (1939).
Sobre
a composição real destes ensaios, possuímos uma boa quantidade de informações,
cujos pormenores podem ser encontrados no segundo volume da biografia de Freud,
pelo Dr. Ernest Jones.
Freud
começara os preparativos para a obra e, em particular, a leitura de grande
quantidade de literatura sobre o assunto, já em 1910.
O
título Totem e Tabu evidentemente já se encontrava em seu espírito em agosto de
1911, embora só viesse a adotá-lo definitivamente quando os ensaios foram
coligidos em forma de livro.
O
primeiro ensaio
(I - o horror ao
incesto) foi terminado em meados de janeiro de 1912, publicado em
Imago em março seguinte e pouco após reimpresso, com algumas pequenas omissões,
no semanário vienense Pan (11 e 18 de abril de 1912) e no diário Neues Wiener Journal, de Viena (18 de
abril).
O
segundo ensaio (II - tabu e ambivalência emocional) foi
lido na Sociedade Psicanalítica de Viena, em 15 de maio de 1912, numa palestra
que durou três horas.
O
terceiro
(III - animismo,
magia e a onipotência de pensamentos) foi preparado durante o outono de 1912 e
pronunciado perante a Sociedade de Viena em 15 de janeiro de 1913.
O
quarto (IV - o retorno do
totemismo na infância ) foi terminado em 12 de maio de 1913 e lido
para a mesma sociedade em 4 de junho de 1913.
Totem
e Tabu foi traduzido em diversas línguas além do inglês, durante a vida de
Freud: em húngaro (1919), espanhol (1923), português (s/data), francês (1924),
japonês (duas vezes, 1930 e 1934) e hebraico (1939).
Para
a última dessas traduções, Freud escreveu um prefácio especial.
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